terça-feira, 12 de dezembro de 2017

Lançamento de Os Meus Descobrimentos

















📕 Próximo Sábado, 16/dez às 17h





Foram dez anos para até aqui chegar. A viajar, escrever, sentir e planear. E, sem dar por isso, fiz aquilo que é um livro. Compêndio de momentos, estórias, pessoas e lugares, que juntos fizeram esta viagem. Périplo na Terra, que afinal é mesmo redonda - e ainda há quem ache que não

Este livro é feito de tempo, dedicação, carinho e pensamento. Também o quis fazer de uma ponta à outra, por mim mesmo, sem interferências de terceiros ou editoras. Afinal de contas, o livro é em si mesmo, um trabalho e quando o passamos a outros para o finalizar, a obra despersonaliza-se. Para evitar isso, contei com a colaboração de pessoas que traduziram o que queria e com as quais, em conjunto, finalizei Os Meus Descobrimentos.

Eles estão agora a nascer. A ver a luz do dia e uma vida nova começar. De repente, Os Meus Descobrimentos deixarão de ser meus. Até porque nunca os imaginei assim. Que sejam nossos. Vividos por mim, mas partilhados em conjunto. 

E é curioso como uma longa estrada, de novo, jaz adiante. Vamos então descobri-la.


João Aguiar

quinta-feira, 30 de novembro de 2017

Reserva o teu exemplar










📕 Os Meus Descobrimentos
 

🌐 Volta ao Mundo em Couchsurfing
🌐 Lançamento em dezembro/2017
👇 Faz a reserva do teu exemplar 
🌐 www.osmeusdescobrimentos.com


quarta-feira, 15 de novembro de 2017

Livro em Pré-encomenda


📕 Os Meus Descobrimentos
🌐 Volta ao Mundo em
Couchsurfing
👇 Faz a reserva do teu exemplar 
🌐 www.osmeusdescobrimentos.com

quarta-feira, 1 de novembro de 2017

Engenheiro da Aldeia

Estávamos no mato de Moçambique, algures entre as províncias de Gaza e Inhambane. Um jipe viajava em missão de reconhecimento e levantamento de necessidades energéticas das aldeias nesta região. Um dos ocupantes era o Osvaldo, funcionário da fundação estatal que atribuía energia a localidades remotas do país. O outro era eu, a conduzir a viatura, funcionário duma empresa portuguesa que instalava os sistemas de energia renovável nessas aldeias. A paisagem era de árvores e mato denso. E as estradas não eram bem estradas, porque apenas havia dois sulcos paralelos recortando a paisagem, de onde aflorava areia, a essência escamoteada daquelas terras. Ali ao lado, a cerca de cem quilómetros estava o Kruger Park, o mais famoso parque de vida selvagem, com uma natureza tão bela e virgem quanto perigosa e mortal. Por mais que estivesse relaxado e focado nesta missão entre mãos, imaginava a possibilidade de nos cruzarmos no jipe com animais como leões, uma manada de elefantes enfurecida, rinocerontes, ou cobras, e quantas havia lá naquele país. A viagem prosseguia incessante e cronometrada. Depois de passar as aldeias de Mabote e Machaíla, conduzia a caminho de Chigubo. Era uma missão com prazos apertados, e uma gestão constante do combustível, horários, quilometragem, recursos alimentares, etc.


Nessa estrada, a certo ponto, soltou-se um estrondo ribombante a partir da parte esquerda do jipe, uma Mahindra, de fabrico indiano, ao mesmo tempo que a direcção do jipe ginou para a esquerda. Valeram as linhas fundas que faziam a estrada, por onde as rodas deslizavam, que mantiveram o jipe no trajecto. Saindo cá para fora, vi que o jipe estava com a roda de trás em baixo. E isto por causa de um tronco tombado na estrada, mas que por não estar completamente chegado para fora, a ponta ainda foi suficiente para embater na jante e assim abrir uma valente fuga de ar, por deformação de um aro da roda. Com o apoio do Osvaldo, martelei aquilo com veemência, usando chaves metálicas pesadas que vinham com o jipe. E o aro da roda ficou mais redondo, apesar de não estar fechada a saída de ar. O suficiente para seguir viagem pelo menos.

A população mais próxima estaria a cerca de uma hora de caminho, pela savana. Seguimos em frente. Não havia indicações, sinais nem quaisquer marcas rodoviárias. E claro, se nem estrada havia sequer. Tudo o que havia eram duas linhas paralelas que se tocavam num ponto de fuga, preso no infinito, assim como toda a restante savana. Mas por outro lado, só havia uma direção a seguir, e era difícil perdermo-nos se a viatura seguisse essas marcas. Enfim, atravessámos a mata densa e plana até ao limite da vista, para de repente se ver o firmamento moçambicano celeste que tão belo combinava com o sol radiante e tórrido africano. Finalmente uma aldeia. Primeiro uma escola, depois um conjunto de cabanas, simples, espartanas, de lama e palha, um pouco mais à frente. Ali ao lado um pequeno largo central daquela aldeia. Parei o jipe na entrada da escola. Com uma arquitectura de escola do período colonial, igual àquela em que o meu pai estudou, e a tantas outras espalhadas por Portugal e pelo antigo mapa colonial lusitano. Perguntei a um professor se conhecia alguém que nos pudesse arranjar a roda do jipe. Apanhados de surpresa, ele e a sua classe, ao que me pareceu, do ciclo primário, ficaram a matutar por instantes, para depressa o professor indicar o nome do Senhor Valter, a viver ali a poucos metros da escola. A aldeia era pequena, e por isso, lá chegámos depressa. No caminho as pessoas curiosas, acenavam, sorriam, aproximavam-se. Mas na correria para cumprir os prazos todos, e acima de tudo voltar com o jipe inteiro a Maputo, não houve o tempo para socializar. No pior dos casos, contudo, voltaríamos à boleia ou de "machimbombo", os autocarros locais. Por isso, haveria sempre solução, e uma estava para chegar.



Da casa que procurava brotaram logo à vista: uma grande antena metálica, com cerca de vinte metros de altura; um espaço aberto à entrada da casa com uma cobertura, e com utensílios de trabalhar madeira em cima da mesa, onde se viam móveis em construção. Ali havia espaço, algo que naquele país aliás havia com fartura, pleno de terra, área e vastidão. E as crianças brincavam cirandando entre umas mesas que estavam em torno da grande antena, provavelmente para sinais de baixa frequência, e o ateliê. Envolvendo este cantinho da aldeia, ondas sonoras brotavam de um rádio em cima das mesas cobertas, de onde se ouvia uma voz informativa da rádio, ainda que com o som familiar mas também incómodo, da desintonia analógica do antigamente que rarefaz a emissão devido à imensa distância que separava a recepção da estação de rádio. Enquanto me distraía com a magia da rádio, uma senhora, parecendo a mãe dos miúdos, aproximou-se de mim, e daí a aparecer o Valter, foram segundos, tendo ela ido chamá-lo. Com um fato de macaco azul náutico, um lápis encurtado pelo uso, pendurado no tubérculo da orelha, e uma carapinha africana já um pouco crescida, de quem é despreocupado com o cabelo, chegou o senhor. De semblante empático, tranquilo e disponível, ouviu a situação, e de poucas palavras, foi buscar numa casa de madeira ali anexa, os utensílios que considerou necessários. Ao abrir a porta desta barraca, caíram coisas cá para fora, em cima de nós. Só um, o Valter lá podia entrar, pois tamanha era a acumulação de todo o tipo de engenhos e materiais, não saberia ele para que momentos dariam jeito, mas que sendo tantos jorraram pela porta. Neste manancial de parafernália acumulada, ele saiu de lá com um martelo e uma bomba de ar, e com o adaptador certo. Pois, como para quem enche uma bicicleta, ter a peça adaptadora errada, deixar-nos-ia sem poder desfrutar daquelas rodas.

Os miúdos da escola já estavam todos cá fora em torno do jipe, e quando tirámos a roda do jipe, ainda mais miúdos se acercaram. Com o ângulo certo para usar a bomba de ar, o seu êmbolo deslizava lento e compassado, comprimindo o ar, preso naqueles cilindros. Para encher melhor, há que o fazer com calma. E assim foi, durante uns quinze minutos, em que voltámos a insuflar o pneu daquela roda. Aquele engenheiro ad-hoc da aldeia, salvou o momento, por ter aquela bomba algures perdida, saber usá-la como ninguém e por se ter disposto a fazer tudo isto pela genuína hospitalidade. A viagem podia seguir, com a roda martelada e enchida. Não deixando de pensar que nas aldeias, nas pequenas comunidades e grupos, há espaço para uma pessoa se realizar a si mesma e contribuir para o grupo social, como sendo o engenheiro, o reparador de problemas, que guarda utensílios, faz móveis, capta os sinais de rádio oriundos de centenas ou milhares de quilómetros de distância. Há necessidade deste conhecimento, há reconhecimento pelo seu trabalho e as mulheres da aldeia apreciavam estas valências, reparava. O meu pai também é assim, um engenheiro auto-didacta, sem qualquer diploma, mas uma vasta experiência em mecânica e electrónica, aprendida pela necessidade, em estaleiros da guerra colonial. E algo disso terá passado para mim. Mas naquele dia faltou-me equipamento. Felizmente havia um engenheiro da aldeia com uma bomba de ar por perto. Porque, na minha opinião sempre há espaço para um, até onde menos esperamos.

João Aguiar

terça-feira, 18 de julho de 2017

Capa no prelo


🔜 Livro sai em Outubro 📕
🌐 Os 5 continentes🌐 Portuguese Riders Crew🌐 www.osmeusdescobrimentos.com📷 Fotos: da minha autoria e estão licenciadas com cc by-nc-nd

segunda-feira, 22 de maio de 2017

No Meio do Mar Plantados


Ainda hoje me espanto com a ideia de que a mil e quinhentos quilómetros a oeste da costa continental portuguesa, existe um outro Portugal. Uma outra dimensão do país que é, inesperadamente, uma extensão ou realidade paralela, nunca deixando de ser parte do todo. Os Açores são um Portugal tão português quanto o restante, mas que de um modo tão surpreendente quanto interessante, aportam uma diversidade, dimensão e profundidade únicas ao país, afinal não somente, à beira-mar plantado.

Aterrar no aeroporto da ilha de São Miguel, João Paulo II, é um momento belo e apreciável, pela paisagem viva e verdejante envolta, que ornamenta os vários promontórios que avistamos, assim como pela cidade de Ponta Delgada aposta, que nos enche a vista quando lá aterramos ou levantamos voo. Chegados, dá-se outro valor ao aeroporto Humberto Delgado, mais sofisticado, complexo e portentoso, como não poderia o deixar de ser também, pela sua localização na capital. Em oposição, nestas ilhas atlânticas não passam tantos voos, mas não deixa de haver uma estrutura aeroportuária funcional, agradável e aconchegante, que nos acolhe no início da viagem.

Quando lá voei, ia abrir, a potenciais compradores, a porta de uma casa que estava à venda. E isto no lado oposto da ilha, a Ponta Delgada, o que me permitiu então calcorrear uma parte do seu território. Fui até Santo António, a Calhetas, onde pelo caminho, em Capelas, pude vislumbrar uma formação rochosa na recortada encosta da ilha, e que ao longe se confundia com o perfil de um elefante a distender a tromba à água oceânica. Depois seguiram-se os Fenais da Luz, assim como a freguesia de Rabo de Peixe, onde sobressaíam a pobreza, o consumo de droga e, em última análise, a degradação da vida, sendo estatisticamente aquela a freguesia mais pobre do país. De seguida, pude conhecer as furnas, junto à Lagoa do Fogo. E se a intensidade da clorofila por lá é distinta, e se esta cor é símbolo de esperança, então por lá mais haverá. Por várias vezes, nesta ilha, dava por mim a recordar-me da Irlanda, e do intenso e carregado manto de relva que a cobria. Os Açores lembram-nos disto.

Outro mistério que pude desvendar nesta ilha, é o sotaque micaelense. De onde virá este fechamento arredondado das vogais, impelido por um contorcionismo vocal das sílabas? Vem da França, pasme-se! Pois, no início da colonização desta ilha vieram vários franceses para a povoar, em conjunto com os portugueses. Outras ilhas, por terem sido colonizadas de outras formas, por exemplo a do Faial, que foi por portugueses e holandeses, deram origem a sotaques distintos neste arquipélago (e tudo isto, em última análise, comprova as teorias de Darwin...).














No regresso a Lisboa, passaria pela Terceira mas devido ao mau tempo no Atlântico (indicava a metereologia), fomos obrigados a pernoitar pelas ilhas. Numa oportunidade única e imprevisível, cruzei-me no hotel pago pela companhia aérea, com o companheiro de causas sociais, o Tito de Morais. Mesmo tão distantes do continente, haveríamos de nos encontrar, a caminho do pequeno-almoço, nos preparos finais para ele ir para a escola onde iria prelecionar, e eu para ir até às Lajes, a caminho de casa. Nesta estadia inesperada, foi também possível calcorrear a Praia da Vitória, que até então apenas conhecia da avenida do Saldanha, onde anos a fio, adorava ir ver os filmes de bollywood e os ciclos da Zero em Comportamento, no já encerrado Cine-estúdio 222. Nesta vila, o sotaque era já padronizado, que tamanha alteridade para o que ouvira horas antes em S. Miguel, me deixou tão curioso e atento, quanto amalgamado. Nesta terra insular, é comum ouvir os locais vangloriarem-se de ser aquele o lugar, durante os últimos cinco séculos, mais português foi, pois aquando da ocupação filipina no continente, o então rei, ainda que por pouco tempo, D. António (Prior do Crato) instalou-se na Terceira, tendo mesmo lá sido instalada a Casa da Moeda. O nome Praia da Vitória, é, também ele, devido a um outro singular episódio da nossa história coletiva, no qual, os liberais liderados por D. Pedro, fizeram sucumbir as tropas absolutistas, do seu irmão D. Miguel. A batalha ocorreu lá, e saindo vitoriosos os primeiros, que depois reinaram o país, ficou assim o nome da localidade.














Os Açores são ilhas diversas, inesperadas e que nos sublimam os sentidos. Compostos por paisagens vivas, feitos de história, e de um sentimento díspar pela terra e pelo mar, são um novo país dentro de Portugal, e agora tanto ao mundo descerrados, que devem ser conhecidos, porque estão ali para nós, no meio do mar, plantados.


segunda-feira, 15 de maio de 2017

Tranquilidade


É a certeza no futuro
de um desenlace ao nosso agrado.
É conseguirmos ver no escuro
mesmo de peito escudado.


É o que sentimos ao ver o oceano
e sentirmo-nos parte dele.
Porque nos invade os sentidos
como se estivéssemos a vivê-lo.

É ouvir a música que acalma,
encerrando os nervos da alma.
Que por segundos, minutos ou horas
nos traz a mente ao espírito, sem pressas nem demoras.

domingo, 14 de maio de 2017

Acreditar ou partir

Engraçado como a história se repete. Ou talvez não... Cem anos depois do milagre de Fátima, e num só dia, o Papa esteve em Portugal, o Sport Lisboa e Benfica sagrou-se tetracampeão nacional de futebol, e, surpresos, admitamo-lo todos (ainda que por uma sistémica descrença nacional), ganhámos a Eurovisão. Para mim, contudo, as duas vitórias não foram surpresa... talvez devesse começar a apostar online

Toda esta conjugação de eventos poderia ser apenas uma coincidência, ou algo de divino. Mas não, cá para mim, não foi uma coisa nem outra, pois a energia anímica vertida sobre a sociedade portuguesa, derivada do primeiro dos três factos, potenciou os outros dois. E interpreto que o Benfica alcançar o "tetra", até seria expectável, mas o Salvador (e lá está a simbologia messiânica do nome, para mais a 13 de maio de 2017) vencer a Eurovisão, caros crentes... desabafem e assumam que isto pode ser considerado milagroso. Talvez seja a reedição dum hipotético milagre que sucede de cem em anos, neste dia, deste mês. E é também curioso que em 1917 as aparições foram largamente adoradas (e instrumentalizadas) na Rússia, em ano de revolução bolchevique, e que à época englobaria Kyiv, (cujo território estaria contudo em disputa) e agora, sucede a vitória do concurso da Eurovisão numa simetria inversa. 

Portugal é hoje em dia, ainda que de um modo escamoteado, um dos países mais católicos e religiosos, do mundo. Pelo que o vigor de um estado laico por cá é questionável. Talvez se verifique um pouco, porque as leis assim o ditam, ou até porque o primeiro-ministro descende de hindus, e esse respeito por esta diversidade transmitir-se-á, em parte, na pesada estrutura vertical da sociedade portuguesa. Lembremo-nos também que Portugal tem a cruz de Cristo estampada seis vezes na sua bandeira... No fundo, a explicação para esta pseudo-laicidade, reside em, por um lado, o "estado laico" ser um princípio republicano francês e em, uma vez mais, termos copiado um conceito legal sem perceber a sua validade por cá, e, por outro lado, em Portugal a religião ser tão estruturante à população, que então, restar-nos-á aceitar esta extrema e inevitável religiosidade, ou partir para outro lugar. Pois não acredito em milagres.


















Fotografia: Sintra.

quinta-feira, 11 de maio de 2017

Motivação

Motiva-me o amor, a paixão
O tempo e a ausência de idade
A vida no campo e na cidade
Assim como o mar e a insularidade.

Movem-me o espaço, a geografia
Os valores e a cidadania
O humano e a humanidade
O humanismo e a verdade.

Se um poeta é um fingidor
Eu não rimo nem sinto
Mas como me comovo e emociono
Eu sou poeta e não minto.



quinta-feira, 4 de maio de 2017

Galapinhos é grande!

A praia de Galapinhos foi este ano eleita a melhor da Europa. Desde os tempos em que lá ia mergulhar com os meus tios e primos de Setúbal, nas férias de verão, que acho isto... e este recanto ainda está no meu top mundial de praias. Galapinhos é grande!



terça-feira, 2 de maio de 2017

Estátuas da Liberdade

Quando regressava a casa vindo das celebrações do primeiro de maio, subi a artéria central do centro de Lisboa, a Avenida da Liberdade. Qualquer alfacinha já lá passou imensas vezes mas acho que quando regressamos e revemos os lugares, há sempre coisas novas que observamos, tal como quando vemos o mesmo filme duas vezes, à segunda há novos pormenores de que nos apercebemos. E assim vi-a de um outro modo.

Ao subir a avenida, um conjunto de estátuas cruzou-se no meu caminho. A primeira de todas, do histórico libertador da América do Sul e Central, Simón Bolívar, a quem se presta uma eterna admiração na República Bolivariana, e lá está o nome dele na etimologia, da Venezuela. Ou na Bolívia, a quem se dedicou todo o nome do país. As árvores da avenida abriram-se num dos passeios laterais, perante o elevado e imponente vulto em bronze verde, deste militar. Ao ler as inscrições na base da estátua, com a lista dos países por ele libertados - Venezuela, Bolívia, Peru, Colômbia, Equador e Panamá - é-me despertada uma imagem de gritos de guerra, revolução, sofrimentos e alegrias populares. Como se todas as lutas e batalhas pela independência, feitas de vitórias e derrotas, do vermelho sangue e da água salgada do choro e suor dos militares, ali estivessem plantadas em respeito àquela pessoa. Não deixei de reparar que foi em 1978, ainda no rescaldo da nossa mais recente revolução, que se homenageou aquele prolífico libertador popular.

Mais acima, um busto, também de bronze, no topo de uma coluna branca, que nos dá pela altura do tronco. O vulto é de Chopin, o génio compositor musical, de naturalidade polaca, e a quem se prestou, há pouco tempo atrás, uma tímida homenagem, ali no outrora "Passeio Público". Deste ponto, ao olhar para o outro lado das faixas de rodagem, vislumbrei um imponente trabalho em pedra granítica e bronze, no qual lia, à distância, em letras grandes inscritas na pedra, "Primeira Guerra Mundial", erigido em homenagem às vítimas, guerreiros e sobreviventes portugueses deste nefasto episódio da história contemporânea. Dela emanava dor e sofrimento mas também vitória, nacionalismo e união dos soldados. Enquanto a via, no plano por detrás, harpejava incessante a bandeira na janela do consulado de Espanha, à porta do qual uma patrulha de polícias armados com metralhadoras até aos dentes, por lá se entretinham, para sempre, à procura de um qualquer sinal terrorista, e com que critérios, sabia-se lá. O máximo que viram, terá sido talvez, embora na residência do embaixador, aquando da memorável manifestação de 15 de outubro de 2012. De resto, nada... e a um custo elevado para o erário público.

O pendente desta avenida que se expande desde os Restauradores (lugar de outra importante estátua aos nossos heróis de 1640) até à "Rotunda", intimida mais do que cansa, e por isso depressa subi outro trecho até ao cruzamento com a Alexandre Herculano, onde são homenageados o político Oliveira Martins, o nosso Almeida Garrett, e outro grande escritor, também político liberal e deputado patriota, que dá nome a esta transversal da "Avenida".



Já no topo da estrada e fim da "Liberdade", aguardava-me não uma rotunda, mas antes uma "turbo-rotunda" (versão melhorada da primeira com duas rotundas separadas e concêntricas), inaugurada há poucos anos atrás, mas com um assinalável erro de planeamento na drenagem de águas, identificado no dia da inauguração, por um cidadão anónimo. A estátua, feita de um exagero de pedra e metal, foi feita em honra de alguém que, tendo feito coisas boas por cá, perseguiu e matou muita gente. Sempre que se apura o campeão nacional de futebol, o alvoroço ao redor deste lugar é exagerado, e só possível num país que respeita tanto ou mais este desporto do que a própria religião. Qual a diferença entre os dois? Perguntava-me e refletia enquanto caminhava.

Depois de calcorrear este ex-libris, pelo menos rodoviário, da cidade, não deixava de me orgulhar de que, se na outra costa do Atlântico Norte, há uma estátua da Liberdade, por cá nós temos todas estas as estátuas na "Liberdade".

sábado, 18 de fevereiro de 2017

O Batman é brasileiro

Livro - Os Meus Descobrimentos - em breve à venda ! Site osmeusdescobrimentos.com a ser finalizado.


O Batman é brasileiro
Aos fãs desta personagem do mundo fantástico das bandas desenhadas norte-americanas e também dos cinemas, porque depois do papel vem a tela de projeção, fica a informação de que o Batman é mesmo brasileiro! E vou aqui comprovar a minha tese.
A arte urbana brasileira é própria, e vive muito de uma caligrafia única no mundo inteiro. No conceito mais lato do que é a arte urbana encaixam-se vertentes como o tagging ou "pixo" (e não é engano) na gíria de rua brasileira, ou como o bombing, silver, wall of fame, trem, etc. Ao olhar do viajante mais atento poderão assemelhar-se os "pixos" a tipografias de rua de crews ou gangues mexicanos mas é singular o que encontramos no Brasil, pelas várias cidades fora mas em especial em São Paulo. O objetivo é o velho instinto humano que nos vem ainda inculcado nos genes: marcar território. E na "mega" urbe de São Paulo, vê-se este fenómeno, assim como as suas consequências de uma forma tão ousada, arriscada e competitiva que é suficiente para imprimir indelevelmente uma memória, boa ou má dependendo do viajante, sobre a arte que se manifesta nas paredes desta selva de cimento colorido. Em resultado desta prática de marcar terreno, jovens sobem, escalando-os autenticamente, prédios de mais de dez andares para lá colocarem a sua marca pessoal, e tipicamente em São Paulo, composta de linhas geométricas, essencialmente de losangos.
Na vertente de wall of fame, e indo agora ao tema do post, nesta gigante urbe, há um conjunto inteiro de ruas situadas na agradável, artística e boémia Vila Madalena, que veem as suas paredes inteiramente pintadas de copiosos, coloridos e complexos graffities. Alguns compostos de estética de desenho pura, outros com mensagem, vide fotografia.
E o que tem tudo isto que ver com o xerife heterónimo de Gotham? O nome da área é "Beco do Batman"! Ora se ele mora ali, veja-se aliás numa das fotografias, então o Batman é mesmo brasileiro! C.q.d.
:)

Livro - Os Meus Descobrimentos - em breve à venda ! - acompanha o blog osmeusdescobrimentos.blogspot.pt e visita o site osmeusdescobrimentos.com


segunda-feira, 6 de fevereiro de 2017

Gales ali tão perto

Livro - Os Meus Descobrimentos - em breve à venda ! - acompanha este blog e visita o futuro site do livro osmeusdescobrimentos.com .


Apenas a duas horas de comboio de Londres, sita a capital de um dos estados que formam o Reino Unido. Na sua designação em português, é mais do que estado, sendo mesmo um país, de Gales. Desde a gare ferroviária de Paddington, localizada na posição estratégica centro-oeste do mapeamento londrino, a partir das cinco horas da manhã circulam velozes e sofisticadas composições de locomotivas e carruagens da marca Hitachi, ao serviço da Great Western Railway (GWR), empresa à qual foi adjudicada a exploração comercial da linha que liga Londres ao País de Gales. E sim o nome desta linha, tal como o da ilha britânica e quase tudo o resto, é também Great. Mas de onde advirá esta eterna e incessante necessidade de este povo se auto-declarar grandioso em tudo? Talvez porque a ilha, em si, é de pequenas dimensões, sendo então imperativo ludibriar os demais - apenas duas vezes e meia maior do que Portugal, e já incluindo aqui a Irlanda do Norte. Mas, por esta ordem de ideias e de afirmação duma pseudo-grandeza, Portugal é também grandioso, ainda para mais, depois de ganhar o campeonato europeu de futebol, o Euro 2016. E se esta necessidade de auto-engrandecimento ainda seria vista como algo crível antes da descoberta do novo mundo, depois desse marco na humanidade, já não faz qualquer sentido, pois o grande de outrora, em área pelo menos de um ponto de vista mais objetivo, já não o é agora, num tempo civilizacional em que países como o Brasil, Canadá, México ou E.U.A. "rebentam" com a pequena Grã-Bretanha, em área.

Estação de Paddington - Londres.






















Pela linha GWR deslizava a composição, ora suave e com baixa turbulência na cabina permitindo assim desfrutar mais da paisagem, ora célere e já trepidante na carruagem de passageiros. Os bilhetes, aconselho a que os comprem antecipadamente, pois a lei do mercado tudo rege neste cantinho do mundo, não fosse o inventor do axioma da oferta e da procura, também ele britânico, o profeta capitalista Adam Smith, apologista da confiança numa mão invisível que rege a sociedade. Na internet, encontram-se bilhetes baratos, logo nos resultados cimeiros da lista do google, e ora, se os vir, agarre-os e "não deixe para amanhã o que puder fazer hoje", pois na estação de Paddington, os bilhetes serão entre 2 a 3 vezes mais caros, dependendo da hora de saída e da procura pelos bilhetes (lá vem de novo à terra o santo Adam Smith, que se manifesta em todos os aspetos económicos desta pequena grande ilha...).

Cardiff, Cardiff, no horizonte. A oeste, e quase em linha reta, de Londres, capital do Reino, ainda, Unido. Reading, Swindon, o entroncamento ferroviário para Bristol, Newport - a primeira cidade galesa que cruzei nesta viagem, e enfim, Cardiff Central.








Um velho amigo aguardava-me à chegada. E ao tempo que não via este jovem. Em adolescentes tivemos um grupo musical de hiphop, e a vida, as relações, as tropelias e trabalhos desta vida, levaram-no para outros quadrantes na Europa... até Cardiff, que parecia ser enfim um destino final para este comparsa. Munido do seu expertise local pude usufruir mais do meu tempo na capital daquele país. A passagem por Newport, cidade mais a Este, já fora de uma beleza inolvidável. Bem cedo, parti do bulício de Londres, eram oito da manhã, duma estação apinhada de profissionais aprumados, a procurarem um lugar vazio no comboio. A maioria ia sair em Reading, lugar de significativo pólo universitário (e onde é que não há boas universidades neste reino, afinal?) assim como também um importante centro de operações da National Grid (ou seja, Reading é uma espécie de Vila Franca de Xira britância, do ponto de vista logístico), e no apeadeiro seguinte encontra-se Swindon, algergue para um cluster de empresas tecnológicas que, mais distantes de Londres, beneficiam da tranquilidade bucólica que os stressados engenheiros tanto precisam para conseguirem gerir as suas equipas. Depois, e passando por uma estação chamada Bristol, mas na verdade situada ainda a dez quilómetros dela, chega-se a Newport, onde o sol, erguendo-se a a Este, se fazia refletir e dourar pelo rio Usk que se estendia por braços de mar até ao sal do Canal de Bristol no Atlântico Norte.


Newport - País de Gales.



















"Cardiff central" é a estação a escassos metros dos principais cruzamentos da cidade. De lá caminhei, tendo parado poucos minutos depois numa loja de venda de instrumentos musicais. Era inevitável! Para perscrutar os preços locais, pois a verdade é que a tecnologia musical é mais ubíqua por estes lados do globo. E em Cardiff os preços poderiam tender a ser mais em conta, do que o poço inflacionário da capital do reino.

Esta cidade, de dimensões médias, é também ela, nos tempos que correm, dominada no seu cerne por um centro comercial. O centro urbano foi requalificado dando origem a uma nova biblioteca e um manancial de galerias, que embora rodeadas por igrejas renascentistas assim como ladeando o impressionante castelo desta urbe, não deixam de ser um conjunto arquitetónico desenquadrado do todo que é a ambiência medieval e mística de Cardiff. Mas os tempos atuais são pautados pelo predomínio do comércio, capitalismo e conhecimento, que é o que econtramos na rua The Hayes. Acrescerá ainda o dissabor de que estas obras de reconstrução no centro da cidade, levadas a cabo entre 2007 e 2010, foram financiadas pela União Europeia... e agora, fundos aproveitados, brexit! Mas verdade seja dita, muito também deram para a UE, os contribuintes do Reino Unido, pois todos nós participamos nos fundos coletivos, através do IVA/VAT

Ao caminhar no centro, na principal rua de comércio da cidade, a The Hayes, poderá o viajante reparar na estátua de John Batchelor, um empresário e político galês do século XIX, também presidente da câmara de Cardiff por um tempo, e a quem foi atribuído o epíteto de "amigo da liberdade", devido à sua campanha contra a escravatura.


 











  



Cardiff é uma cidade média, que no seu conjunto do centro e arrabaldes, abriga 350 mil habitantes. Duma ponta à outra, vão cerca de seis quilómetros, e se imaginarmos uma cidade como um círculo, pois esta não passará de metade, pois situa-se e cresceu em meia-lua, limitada pelo mar. Se tentar estabelecer um paralelo entre esta cidade britânica e uma portuguesa, apenas para que o leitor possa mais facilmente visualizar esta cidade pelo seu tamanho, apontaria para a área urbana de Setúbal, também assente na costa e limitada pelo mar, e o rio.

Seguindo caminho das recentes galerias até ao fim da rua The Hayes, a "rua direita" de comércio de Cardiff, avistamos então à esquerda o Castelo de Cardiff, e à direita a Câmara Municipal. A extensa, quadrangular e geometricamente perfeita forma do castelo impressiona e invoca o viajante até ela. Não obstante, o conjunto de edifícios da municipality e da universidade, além de bonitos incluem nele inscrições como "Poetry and Music". Ainda muito no centro, e mesmo ao lado do castelo que serviu de base à cimeira da OTAN/NATO em 2014 (e que não teve nem metade das manifestações que se viram em Lisboa em 2010 - ler o romance "Ativistas"), encontra-se o vasto, plano e apaziguador Bute Park, e que tem de facto motivos para se convidar alguém para lá ir... "bute lá?" :) Como é apanágio nos países anglófonos desenvolvidos, os bancos de jardim são o espaço preferencial para fazer uma dedicatória oficializada a alguém perecido, o que é visível pelas imensas pequenas placas colocadas a meio do encosto do banco, onde muitos locais prestam homenagem a entes queridos. Cerceando os vislumbres que se tem da cidade a partir da estação de comboios, marca também presença o estádio municipal pelos seus elevados, curvos e portentosos arcos metálicos, deste recinto desportivo que há bem pouco tempo, em 2015, recebeu alguns dos jogos do campeonato do mundo de rugby.  





  

 


 


Pelas ruas da cidade, respirava-se a frescura marítima, enquanto se passeia por um misto de história e obras urbanas mais recentes. As placas de trânsito e com direções são bilingues, com espaço também para o galês, língua de matriz celta e praticamente indecifrável para o habitual falante e leitor de inglês. 




 





No que refere à gastronomia, o que esperar da culinária nativa britânica? Ainda que a maior gentileza, agradabilidade e singeleza de Cardiff e do País de Gales, possam ser também manifestadas na comida local, optei por, e não resisti, a sentar-me à mesa num restaurante de inspiração portuguesa (sim, e de inspiração apenas, porque a comida já estava algo cafrealizada no ecossistema local), onde me serviram um bife na pedra acompanhado de uma cerveja super bock. O Nando's das galerias de restauração Brewery Quarter estava lotado, e como tal, servi-me deste cantinho pseudo-lusitano ali ao lado. De destacar os maus modos do gerente do espaço que ao saber que sou de Lisboa, se fechou na conversa, expressão facial e se enrolou em atrasos dos pedidos para a mesa. Ainda estas infantilidades norte-sul... e talvez ainda mais presentes, fora deste retângulo à beira-mar plantado.

No final do passeio, "merenda comida, companhia desfeita", e se não eu aprecio este adágio, desta vez foi mesmo assim, rumando a Londres de volta e num bilhete mais barato, pois a procura pelas três da tarde é menor... Oh Adam Smith que estais no céu.... :) é imperativo lembrar. Bem, e no fim do dia, de regresso a metrópole londrina, pensava para comigo que com Gales ali tão perto, esta Bretanha não é assim tão grande.













Livro - Os Meus Descobrimentos - em breve à venda ! - acompanha o blog osmeusdescobrimentos.blogspot.pt e visita o site osmeusdescobrimentos.com